Clija Chait relata trajetória de vida na edição deste domingo (22) da Tribuna do Norte
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Aprendizado com a avó em Cerro Corá |
Por Letícia Medeiros*
Seridoense de Cerro Corá, a
empresária Clija Chait tem conquistado cada vez mais espaço no mercado
gastronômico de Los Angeles, nos Estados Unidos. Por lá, ela e seu marido Bill
Chait comandam mais de 20 empreendimentos no ramo da alta gastronomia, com cozinhas
premiadas e lideradas por chefs renomados. Sua história de vida poderia,
facilmente, ser foco de uma produção hollywoodiana. O caminho para chegar nesse
patamar foi árduo. Sem esquecer de suas origens, o mais novo negócio de Clija
tem endereço em São José do Campestre, onde abriu nesta sexta-feira (20) o
Precioso Supermercado.
Criada em um sítio a quatro horas
de Cerro Corá, Clija comenta que os ensinamentos passados por por seus avós - a
quem chama de pai e mãe - foram a base da sua educação, algo primordial para
sua formação na área gastronômica. “Cresci no meio do mato, colhendo fruta da
árvore, cozinhando em fogo de lenha e pescando com a mão. Nós não tínhamos
refrigeradores, minha mãe usava linhas para pendurar peixes no sol e fazer a
secagem para não estragar. Todas essas técnicas gastronômicas foram algo que
aprendi e trouxe para minha vida”.
Aos 15 anos de idade, veio para
Natal contra a vontade dos pais, onde começou a trabalhar como babá e também
teve uma experiência na empresa Guararapes. Iniciou no ramo gastronômico como
garçonete e passou a atuar na área administrativa em restaurantes italianos da
capital. “Sempre tive a gastronomia
aguçada e esse lado empreendedor em mim. Minha mãe vendia doce de leite e eu
pegava o restinho, botava em copos e saía no meio da rua para vender. Adoro
cozinhar, mas a área administrativa é a parte mais me completa”.
Com 24 anos, foi morar em São
Paulo onde conheceu seu marido, o renomado restauranter estadunidense Bill
Chait. “Antes da mudança, sentia muitas coisas negativas acontecendo. Acabei
entrando na área de estética porque eu realmente fazia o que aparecia. Não
tinha uma condição financeira incrível, eu vivia ali no baixo mesmo e surgiu
essa nova oportunidade. Conheci meu marido em uma reunião de trabalho porque
também trabalhei em restaurantes por lá”, relata.
O relacionamento seguiu à
distància até que Clija mudou de forma definitiva para Los Angeles em 2016.
Nesses seis anos, fez um curso de contabilidade na UCLA (Universidade da
Califórnia em Los Angeles) e passou a trabalhar na administração das empresas do
casal.
Atualmente com 31 anos, desde que saiu da casa
dos pais passou a se governar e valorizar essa independência. Hoje, o maior
problema é a saudade dos seus.
Durante a pandemia, esse
sentimento foi agravado. Além disso, o setor de alimentação fora do lar foi um
dos mais duramente afetados no período. “Foi bem difícil, era doloroso ver
nossos restaurantes fechados, construídos com tanto suor, amor e criatividade.
E aí, temos duas escolhas: se lastimar ou correr para fazer as coisas
acontecerem. Ficamos ligados no que o governo ia fazer e recebemos um estímulo
financeiro. A pandemia realmente rasurou alguns de nossos restaurantes enquanto
ajudou outros. Não fechamos nenhuma unidade, mas sofremos”, diz.
Em um mercado tão competitivo
como o de Los Angeles, a linha elaborada pelos empresários para garantir a
qualidade do serviço e produto é um diferencial. Questionada sobre a
possibilidade de abrir um restaurante em terras potiguares, Clija descarta a
opção. “A falta da nossa presença no estabelecimento gera uma complexidade
porque acreditamos em um atendimento ótimo e na entrega e apresentação de uma
comida de excelência”, comenta. Dentre suas atribuições, a empresária também
comanda uma empresa de eventos para celebridades.
Da Alex Atala até a galinha caipira
de Dona Fátima
Atualmente, Clija atua na
administração dos restaurantes Tesse, Mian Taste, Caboco e Fanny's. As cozinhas
vão da comida mediterrânea para a chinesa, passando pela brasileira e chegando
no Museu do Oscar em Los Angeles. Além disso, são sócios da loja de vinhos
Boutellier Wines e da Tartine Bakery, uma rede de padaria premiada, com
quatorze unidades nos Estados Unidos e Coreia do Sul.
Para ela, gastronomia não é só
sobre o alimento, mas sim sobre uma experiência. Essa perspectiva de mundo vem
desde pequena quando ainda morava com seus
avós – Dona Ana Maria e Seu João Duarte - que eram agricultores e
trabalhavam no campo. “A minha maior inspiração de negócios foi o meu pai. Ele
sempre me incentivou muito, tinha o roçado dele e me deixava fazer uma
plantação pequena. Tudo que ele fazia para ele, fazia para mim, e minha mãe me
ensinou a parte gastronômica”.
Clija lembra de momentos da sua
infância onde tinha pouco, mas sentia que tinha muito. “O ser nordestino, o
nosso povo, é algo que temos que valorizar. No interior, as pessoas podem ter
só um prato de comida, mas mesmo assim dividem com quem tem necessidade. Você
não vê isso nos Estados Unidos. Por isso, como a comida da cozinha de Alex
Atala e também a galinha caipira de Dona Fátima no Restaurante do Totóia”.
Em certos momentos, passa um
filme na cabeça ao relembrar tudo que passou e aonde conseguiu chegar. Gratidão
é a palavra que a move. Muitos anos atrás, mal conseguia pagar o aluguel,
praticamente só comia miojo e passava por momentos de revolta com o que estava
dando errado na sua vida. “Já cheguei a ajoelhar e chorar, perguntando a Deus o
porquê, mas eu não desisti. Chorava e no outro dia levantava e seguia
novamente”, diz. Quando menina, por volta dos seis, sete anos, destaca um episódio
específico, onde viu um avião passar e escutou sua mãe dizer que, um dia, ela
voaria mais alto.
“Lembro dessas falas, lembro com
tristeza das dificuldades que passávamos. Lembro do tempo que minha mãe
esperava chover para lavar roupa nas pedras. De acordar e perguntar o que tinha
no café da manhã e ela responder, “minha filha, hoje não tem, vá caçar, vá
procurar goiaba”. Hoje, eu posso ajudar meus pais e tudo que eu faço é para
eles. Olho para o meu passado e vejo que Deus me preparou de uma forma genuína,
desde lá da minha infância onde eu comia piaba seca com farinha, até ter o
poder aquisitivo de ir em restaurantes com estrelas Michelin”.
Quando não está ocupada com os
negócios, entre seus outros interesses, gosta de viajar, conhecer pessoas novas
e tem uma apreciação especial pela arte e moda. Porém, brinca que sempre busca
puxar esses temas e vincular com a gastronomia. Por tudo que passou e por todos
com quem conviveu, os pés de Clija não saem do chão. “Minha mensagem é não
desistir. Todos os dias, acordo de manhã, e se eu tiver um objetivo, falo em
voz alta sem ninguém ouvir porque quero que eu mesma saiba daquilo. Eu digo
“vou atingir, quero atingir” e não paro até conseguir”, finaliza.
Novo empreendimento será no
agreste do Estado
Em passagem pelo Brasil,
inaugurou nesta sexta-feira (20) seu mais novo empreendimento: a primeira
unidade do Precioso Supermercados em São
José do Campestre. O conceito do local é de um ambiente “boutique” em pouco
mais de 300m², com planos para expansão em outros lugares do estado. O negócio
surgiu a partir de uma parceria de Clija com sua amiga de longa data, a
administradora Priscilla Costa.
O intuito do empreendimento é
proporcionar ao povo do interior um conceito diferenciado do que é fazer
compras. Para tanto, o Precioso conta com uma extensa variedade de produtos em
mercearia, hortifruti, limpeza e padaria, além de dispor de preços justos e
entrega em domicílio. A primeira unidade vai contar com o trabalho de
profissionais locais e de cidades vizinhas, prezando pela excelência no
atendimento.
Segundo ela, a idealização do
projeto exalta e celebra a cultura e história do povo nordestino e sertanejo.
“Priscilla trabalhou comigo por muito tempo e surgiu essa ideia de fazermos
algo juntas. Minha vontade era permanecer no ramo de alimentos e decidimos em
um supermercado. Preferimos começar em
São José do Campestre porque é
onde ela mora. Investimos em algo bonito, mas acessível para o público porque é
feito para eles. A minha intenção é retornar para retribuir o que as pessoas
daqui fizeram por mim durante os períodos tão difíceis da vida”, diz a
empresária.
*Letícia Medeiros é repórter na Tribuna do Norte